Sunday, December 10, 2006

GATOS PARDOS (6)

UM BOI EM CIMA DE UMA VELA

JOSEPH, homem corajoso, dono de uma enorme ambição e muita esperança, convida ADAM para uma estranha empreitada:
munidos de foice, enxada e pá, numa bicicleta emprestada na véspera, os dois velhos amigos e vizinhos chegam bem próximo ao lugar indicado, meio dia, em ponto, na segunda lua cheia do verão, sem testemunhas, tudo conforme determinava o "aviso" recebido num sonho: há um pote cheio de ouro enterrado sob as raízes da jaboticabeira do final da raia.
Depois de percorrerem, à pé, alguns metros da antiga pista encravada na densa mata costeira do sul da ilha, constatam-na, agora, dominada por cortantes capins-serra e traiçoeiras urtigas floridas; os gravatás aguados, nascedouros de mosquitos e pernilongos, abrigam algumas famílias de sapos cantantes; sob as folhas secas abundantes, receiam a presença de animais rastejantes. ali já não havia corridas de cavalos há alguns anos, concordam ambos, antes de quase tropeçarem num simpático gambá.
E a centenária e frondosa jaboticabeira? Só avistam restos chamuscados de seu tronco, antes robusto e avermelhado, ora ilhado por buracos. Decepção!
__ Chegamos tarde demais!
Contudo, cavamos mais um monte de buracos e nada. Eu já estava de saco cheio. José? Apesar de quase morto de cansado, não desistia. Lá pelas tantas, caiu uma forte ventania, em rajadas açoitantes. e, de repente ... , à distância, não muita, surge uma sombra repentina e, nela, um cachorro preto, grande, rosnando, dominado às custas por um pequeno homem, mulato, semi nu, passos curtos e rápidos, com cara de poucos amigos e mudo. Nenhum sinal.
Logo, vieram pedras, uma chuva delas. caíam próximas, mas, estranhamente, não nos atingiam. eu, morto de medo, claro, tremia qual uma vara verde.
-- Vamos embora Zé, vamos! - insisti.
Não. Valente, ele persistia cavando.
-- O medo é o azar da vida, rapaz!
Mais vento e mais pedra!
Eu heim!, saí correndo. Só parei perto do velho pontilhão de madeira que cruzava o riacho, perto da estrada. Ali, previamente, havíamos marcado para um eventual reencontro. não demorou muito, José apareceu. Querendo mostrar tranqüilidade mas todo sujo e encharcado de tanto suor, disparou: "vi um boi sentado em cima de uma vela."
Acordei!! ... quase sufocado pela fumaça, a tempo ainda de apagar a chama da vela, caída, queimando a fina camada de cera do assoalho do pequeno dormitório do pavimento superior do sobrado reservado aos empregados da fábrica de lingüiças, onde eu dormia, enquanto lá permaneci refugiado, sem vontade de frequentar as aulas do primeiro ano do ginásio.
- o quê? -- perguntou o motorista com uma ponta de ironia -- um boi sentado em cima de uma ... de uma vela?! ah,,, não!
Como ...?! - assustou-se a passageira, depois de instantes calada - Como o senhor ouviu?!
Ouvi tudo, senhorita..., tudo!
mas ... eu não... estava só...... mais depressa, por favor, senhor!
-- Quem muito depressa corre, bate e chega tarde; quando chega, senhorita! "Apressa-te devagar", diz o provérbio, -- comenta o motorista. E continua, ensinando:
-- Quanta saudade da troca de revistas na porta do cinema, nas tardes de domingo, antes das matinês: o Zorro e seu amigo Tonto; Roy Rogers. Ah, e O Fantasma e seu cão Capeto, lembra-se? Os amigos dos pigmeus , aquela tribo de homens pequeninos que habitavam a grande floresta negra, onde trabalhavam com ouro e cuidavam de imensos tesouros escondidos, negados aos desmedidos forasteiros ambiciosos? Pois a ambição é perniciosa, senhorita! Ademais, neste mundo, creia, não gozamos de um domicílio duradouro e eterno, como imaginam os vaidosos integrantes da ala da cobiça, mas sim, de uma pousada frágil e provisória, todavia um maravilhoso e extraordinário legado da Natureza, de Deus, a quem, verdadeiramente, coube a tarefa divina de criação. Os evolucionistas, senhorita....

No comments: